Foto do Perfil

Atendimento Publius

online
X

Olá, seja bem vindo(a) a Publius, Escola de Altos Estudos. Para que possamos prosseguir com o atendimento é necessário digitar as informações abaixo.

aguarde.

Ícone Whatsapp Ícone Whatsapp

Inicie uma conversa com a Publius e esclareça todas as suas dúvidas.

(11) 96364-1060

PUBLIUS - Escola de Altos Estudos

Banner Desktop: Se tem tabuleta, tem história! Banner Mobile: Se tem tabuleta, tem história!

Artigos

Se tem tabuleta, tem história!

Publicado 11 de Setembro de 2025

Marcus Vinicius de Azevedo Braga
Doutor em Políticas Públicas (UFRJ)

Na pacata cidade de Sabedoria, Aníbal ficava intrigado na hora do almoço, pois toda vez que ia ao restaurante do Mané Galinha, via logo na entrada do toilette um visível cartaz dizendo: "Proibido subir com os pés em cima do vaso sanitário".

Obviamente, pensava Aníbal, o vaso é feito de louça e não aguenta o peso de um adulto e pode se quebrar...mas, quem faria isso em sã consciência?... pensava ele com seus botões.

Um dia, incontido de curiosidade, perguntou privativamente ao dono do estabelecimento, Mané Galinha, o porquê daquela placa, e recebeu uma sonora resposta, acompanhado de um sorriso de canto de boca: "-Se tem tabuleta, tem história!"

Essa fictícia narrativa ilustra um conceito basilar, mas um tanto desprezado na gestão de riscos, que é a percepção de risco, ou seja, a crença de que algo é ameaça ou não, sem uma grande base de estudos e evidências, gerando super e subestimativas de riscos.

Segundo a norma ISO 31000, de 2018, o risco é o efeito da incerteza nos objetivos, sendo normalmente expresso em termos de suas consequências e suas probabilidades, ou seja, importa no seu dimensionamento o seu impacto quando se materializa o risco e a chance de sua ocorrência, em termos estatísticos.

O cálculo desse impacto e dessa probabilidade é extremamente oneroso, e no mundo dos riscos corporativos a subjetividade é a regra, ainda que balizada por critérios e instrumentos, e essa percepção da magnitude do risco é carregada de fatores culturais e conjunturais, como é qualquer exercício de modelagem de futuros.

Fatores como o efeito traumático de algo impactante e o medo decorrente, ou ainda, outros fatores derivados das discussões de economia comportamental (Heurísticas e vieses), trabalhados na obra “Rápido e devagar: Duas formas de pensar”, de Daniel Kahneman, datada de 2012, afetam a percepção de risco e a construção do que pode afetar os objetivos, e em que medida.

Destaca-se, nessa linha, o Efeito âncora, que utiliza algo visto anteriormente ou alguma informação que você tenha para influenciar a percepção do indivíduo; ou ainda, a Regressão a média, na qual acreditamos que amostras pequenas se parecem muito com a população da qual são extraídas, enviesando nossas inferências. 

Os agentes de gestão de riscos são humanos e sujeitos as limitações dessas condições, que precisam ser identificadas e mitigadas. O histórico de ocorrências com proporções desastrosas é um grande condicionador do que achamos ser risco, e nesse sentido, a tabuleta é o indicativo de que situações em tese absurdas, ao se tornarem reais, afetam não só a percepção do impacto, mas também a da probabilidade. 

A experiência é uma boa fonte de identificação e mensuração de riscos, mas o fato ocorrido pode ser eclipsado nas suas causas reais pela versão assumida, e o que apontamos como causa pode não ser, induzindo a construção de salvaguardas que não dialogam com a essência dos riscos. 

No caso da tabuleta, o cidadão alcoolizado pode ser a causa e não simplesmente pôr os pés no vaso sanitário por vontade própria, e talvez seja melhor uma tabuleta que foque no consumo de álcool de forma consciente. 

Na gestão pública, ambiente onde somos cobrados de forma cotidiana pela forma que gerenciamos os riscos, ainda que isso não se dê de maneira formal, entender a essência do que é percebido como risco, e o porquê é assim percebido, pode ser a chave para se evitar desperdícios e falhas de execução.

O poeta português Fernando Pessoa no poema “Tabacaria”, de 1933, indica sobre as tabuletas:

“Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o desconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e 
vivendo por baixo de coisas como tabuletas.”

Mas do que saber da tabuleta e das suas histórias, das pessoas que vivem a sua sombra, no processo de gestão de riscos importa identificar forças, vieses e percepções que fizeram aquela história ter relevância e que tipo de salvaguarda ela nos leva a construir, para que não fiquemos fossilizados a perigos inexistente, esquecidos das reais ameaças.  


* Este texto não reflete necessariamente as opiniões do Diálogos Publius.


Assine nosso newsletter.

Este site é protegido pelo reCAPTCHA e a Política de Privacidade e os Termos de Serviço do Google se aplicam.